Publicado em 11/08/2023 às 17:30, Atualizado em 11/08/2023 às 21:39
Em março de 2023, um ataque a facadas a uma professora da rede estadual paulista terminou em morte e deixou quatro pessoas feridas. Essa notícia levantou o debate sobre a violência escolar nas salas de aula do país.
Diversas pesquisas indicam alta incidência de casos de agressão no ambiente escolar, sobretudo no Brasil. O caso despertou a necessidade da criação de políticas públicas voltadas ao combate da violência nas escolas.
Neste texto, te explica o que é violência escolar, quais são os tipos e traz alguns dados que mostram como o Brasil se comporta em comparação ao contexto mundial.
Entenda o conceito de violência escolar
Antes de compreender o significado de violência escolar, vamos entender o conceito de violência.
A violência corresponde ao uso intencional da força ou poder em forma de ameaça, podendo ser contra si mesmo ou outra pessoa, grupo ou comunidade. De acordo com a Organização Mundial de Saúde -OMS, os resultados de uma ameaça violenta podem ocasionar lesão, morte, dano psíquico, alterações do desenvolvimento ou privações.
A escola é o espaço de formação intelectual e cidadã e espera-se que este seja um lugar munido de proteção e segurança. Entretanto, o atual cenário brasileiro evidencia outra realidade.
A violência está presente no ambiente escolar, manifestando-se de diversas formas. Essa violência é reflexo da vida social, sendo, muitas vezes, uma reprodução de violências do mundo social, baseadas em preconceitos contra minorias sociais.
Portanto, violência escolar corresponde ao uso da força e/ou agressividade dentro do contexto/ambiente escolar e pode se manifestar entre todos os atores sociais da comunidade escolar: estudantes, professores, coordenadores, responsáveis e demais funcionários.
As consequências destas ações têm efeitos em todos os envolvidos: tanto nas vítimas quanto nos autores. Os resultados vistos são: depressão, suicídios, distúrbios comportamentais, prejuízo às atividades em sala de aula e abandono escolar.
Tipos de violência escolar
A violência pode manifestar-se de diversas formas, desde a psicológica até a física ou a verbal. Dentro deste cenário, pode variar quem é agressor e quem é a vítima. Ou seja, qualquer membro da comunidade escolar pode se tornar vítima da violência. Existem diversos tipos de violência que podem ocorrer dentro desse espaço, por isso, listamos alguns dos cenários possíveis de acontecer:
• Violência de aluno (agressor) para professor (vítima): nesse caso, pode ocorrer atos de violência física, psicológica e verbal, como proferir insultos e ataques dentro e fora da sala de aula, ameaças de morte e outros;
• Exclusão de algum aluno de modo proposital: a exclusão é um tipo de violência psicológica e ocorre quando um grupo de alunos decide excluir um aluno das tarefas da turma, agindo como se essa pessoa não existisse, ao passo que ela se isola;
• Violência sexual: este ato ocorre quando nota-se a presença de condutas sexuais indevidas no contexto escolar e ocorre de um aluno para outro aluno, de professor para aluno, de professor para professor, entre outros;
• Bullying: são agressões intencionais, perseguições, apelidos depreciativos e/ou humilhação em público. Com este tipo de violência, o agressor consegue o controle físico e psicológico sobre a vítima. Atualmente, o bullyng é considerado um dos tipos mais comuns de violência escolar e uma das causas de suicídio entre os jovens;
• Violência entre professores: são ofensas e maus-tratos feitos de um professor ao outro, o que também inclui assédio, violência sexual, coerção, por exemplo;
• Violência de pais e professores: consiste em toda ameaça e danos físicos causados pelos responsáveis dos estudantes aos professores, podendo ocorrer ou não em horário de aula.
Dados recentes sobre a violência escolar
Anualmente, os casos de violência escolar têm crescido na realidade brasileira. No ano de 2022, entre janeiro e agosto, foram registrados mais de 100 boletins de ocorrência por lesão corporal e ameaça em escolas no Tocantins, tendo professores como 80% das vítimas.
Em uma pesquisa realizada pela Revista Nova escola entrevistou 5.300 professores de todo o território nacional e registrou que 80% disseram já ter sido vítimas de algum tipo de agressão, sendo a maioria violência verbal, seguido de violência psicológica e ao menos 7% dos profissionais já teriam sido agredidos fisicamente.
A violência ocorre não só contra educadores, mas também entre os próprios alunos. Principalmente quando toca o sino para o intervalo, ainda muitos professores seguem para o pátio junto aos alunos, o que não precisava ser feito, quando podia seguir para a sala dos professores, como de costume. Porém, desde fevereiro de 2022 após a Pandemia, os docentes deixaram de ter seus 15 minutos de descanso, pois precisam estar com os estudantes a fim de evitar brigas.
Este não é um caso isolado, segundo as Secretarias de Educação de São Paulo, e de Mato Grosso do Sul após a volta das aulas presenciais, somente nos dois primeiros meses de 2022 foram registrados milhares de agressões físicas nas unidades estaduais e municipais. Números alarmantes de ocorrências por dias letivos, pois são 48,5% a mais do que o mesmo período de 2019, último ano de aulas presenciais antes da pandemia de Covid-19.
Além das agressões físicas, também houve crescimento de 52% de ocorrências de ameaça e 77% de casos de bullying nas escolas em relação a 2019.
Segundo o levantamento global da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado ainda em 2019, o Brasil está entre os índices mais altos do mundo no ranking de agressões contra professores. Foram entrevistados 250 mil professores e líderes escolares de 48 países ou regiões. De acordo com os estudos, concluíram que:
• No Brasil, há o ambiente mais propício ao bullying;
• 28% dos diretores escolares brasileiros testemunharam situações de intimidação ou bullying entre alunos. Este é o dobro da média da OCDE;
• Semanalmente, 10% das escolas brasileiras registram episódios de intimidação ou abuso verbal contra educadores, ao passo que a média internacional é de 3%;
• Em 2017, 12,05% dos professores disseram ter sido vítimas de agressões verbais ou de intimidação de alunos pelo menos uma vez por semana. A média global é de 3,4%.
Ainda, os tipos de violência mais comum executadas contra professores são:
• Agressão verbal: 48%;
• Assédio moral: 20%;
• Bullying 16%;
• Discriminação: 15%;
• Furto/roubo: 8%;
• Agressão física: 5%;
• Roubo ou assalto à mão armada: 2%.
Ao passo que os tipos mais comuns de violência contra estudantes são:
• Bullying: 22%;
• Agressão verbal: 17%;
• Agressão física: 7%
• Discriminação: 6%
• Furto/roubo:4%;
• Assédio moral: 4%
• Roubo ou assalto à mão armada: 2%.
Quais são as causas dessa violência?
As análises de questões que envolvem a violência escolar geralmente são feitas sob a ótica social e/ou psicológica. Entretanto, não é possível definir uma única causa para esta questão: o problema da violência é profundo e complexo.
Há um conjunto de motivos que podem explicar a violência nas escolas, as causas são variadas e dependem do contexto que as instituições estão inseridas.
Especialistas acreditam que o aumento do número de casos de violência nas escolas é reflexo da pandemia. Isso porque durante o ensino remoto, período em que as escolas estavam fechadas, parte das crianças e adolescentes teriam desaprendido a ouvir e controlar emoções, por exemplo.
“A violência é um destes fenômenos que vêm se agravando a partir da pandemia. Agora que as aulas voltaram de forma presencial essa violência acaba eclodindo aqui. Esse adolescente demonstra essa violência que talvez já estava inserido, já se manifestava em outros contextos, acaba emergindo aqui”
A alta incidência dos casos de violência em ambiente escolar é o que tem chamado a atenção de especialistas
“Infelizmente, pela falta de estrutura, a escola, em vez de ajudar a reduzir os impactos que essa violência teria sobre os adolescentes, acabam potencializando, exatamente porque não é um ambiente adequado”, aponta o professor em depoimento dado ao jornal da USP.
Ações violentas são desencadeadas por motivos diversos, por isso, deve-se levar em consideração a própria realidade vivenciada pelos indivíduos, como o convívio doméstico, familiar e social.
Além dos efeitos pós-pandemia, constata-se que a crescente da violência é resultado da ausência de educação contra formas de intolerância, sobretudo contra minorias. Dessa forma, violências encontradas na vida social são reproduzidas dentro do ambiente escolar, como o racismo e a LGBTfobia. Os currículos escolares deveriam incluir matérias sobre direitos humanos, cidadania e cultura de paz, além disso, acredita que a saúde mental dos alunos não deve ser mais um tabu.
Ataques aos ambientes escolares não eram comuns no Brasil, porém, a frequência teria aumentado a partir de 2018. São diversos os fatores que tornaram a violência mais presente no cotidiano escolar, alguns que entram nessa lista são:
• Isolamento social: os estudantes estariam vivendo os efeitos pós pandemia, resultado de meses convivendo fora das salas de aula e dependendo apenas da tecnologia para interações sociais;
• Exposição à violência: algumas crianças e adolescentes estiveram expostos a violência e maus-tratos nos espaços familiares;
• Tecnologia: o acesso à internet sem mediação de um responsável teria tornado mais fácil o consumo de fóruns da internet, sobretudo na deep web, que disseminam ideias e conteúdos violentos;
• Polarização: a partir desse período, 2018, passou-se a notar uma polarização entre a adoção ou não de medidas sanitárias durante a pandemia, além de uma polarização social e política no país, o que serviu de combustível para ideias extremistas entrarem em pauta.
Para os educadores, quais são as razões da violência nas escolas
• Aumento de doenças psicológicas por causa do isolamento;
• Influencia negativa dos familiares em virtude da vulnerabilidade que eles vivem e escassez de base de conduta social;
• Falta de socialização dos alunos perante a pandemia;
• Falta de ações disciplinares para os atos praticados pelos alunos;
• Influência da região onde reside o aluno e está a escola;
Os educadores sugerem algumas soluções para o problema:
• Criação de um plano de convivência, com regras e ações feitas coletivamente;
• Desenvolvimento de competências socioemocionais com alunos;
• Organização de ações de mediação de conflitos;
• Orientação e/ou formação socioemocional para professores;
• Novas medidas de políticas públicas;
• Ações para incentivar uma gestão democrática;
• Reuniões constantes com os familiares dos alunos.
Plano de combate à violência escolar
Após o caso do estudante de 13 anos que matou uma professora a facadas em São Paulo, o Ministério da Educação-MEC, propôs a criação de um grupo interministerial para tratar de ataques nas instituições de ensino. A proposta tem como objetivo elaborar um programa de combate à violência e terá a participação dos municípios e das unidades da Federação. Mas a comunidade escolar deve cobrar dos municípios e Estados a continuidade desses programas e que garantam a segurança nas escolas. Pois o espaço escolar é essencial para o desenvolvimento das crianças e dos adolescentes.
O maior problema encontrado é a falta de políticas públicas de enfrentamento ao aumento da violência nas escolas, pois as ações adotadas após a volta das aulas presenciais focaram mais na recuperação de aprendizagens do que em problemas socioemocionais enfrentados pelos estudantes. Além disso os professores também precisam de formação e apoio socioemocional para lidar com esta situação.
Os casos de violência escolar devam ser tratados por uma rede de proteção social instituídas no municípios, a fim de adotar a medida mais adequada, formada por: a) educadores da escola, b)psicólogos, c)assistentes sociais, d)policiais, e) promotoria e vara da infância e juventude. E orientação para responsáveis e programas de atendimento de saúde mental.