Buscar

“Caso João Dan” promove debate nacional sobre independência entre instâncias cível e criminal

Tema desafia o princípio da independência das instâncias judiciais, já consagrado pelo Supremo Tribunal Federal

Cb image default
Imagem: Arquivo CMNA

O “caso João Dan”, relativo às eleições de 2016, em que é acusado de compra de votos por distribuir combustível a eleitores para participar de atos e carreata de campanha, voltou à tona nesta semana em virtude da análise do caso pelos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O pedido de vista do ministro Ricardo Lewandowski, na terça-feira (21), adiou a análise final, mas serviu para promover debate sobre a independência entre as instâncias cível e criminal, com portais especializados na área jurídica e jornais repercutindo o caso nova-andradinense em âmbito nacional.

O site Consultor Jurídico, referência no país, foi um dos portais a abordar o episódio. “A independência entre as instâncias cível e criminal é suficiente para permitir que a Justiça Eleitoral, com base nos mesmos fatos e provas, afaste a ocorrência do ilícito eleitoral de compra de votos, mas imponha pena criminal pela mesma conduta?”, questionou

Entenda o que está em debate

Conforme relembrou Conjur, na seara cível-eleitoral, o Tribunal Regional Eleitoral julgou a ação de investigação judicial eleitoral contra ele improcedente, por entender que as provas eram insuficientes para comprovar a prática da captação ilícita de sufrágio, ilícito descrito na Lei Complementar 64/1990.

Ainda segundo o portal jurídico, posteriormente, com base exatamente nos mesmos fatos e provas, o TRE-MS condenou João Dan a três anos e quatro meses de prisão em regime inicial aberto pelo crime descrito no artigo 299 do Código Eleitoral: dar qualquer vantagem para obter voto.

O tema desafia o princípio da independência das instâncias judiciais, já consagrado pelo Supremo Tribunal Federal. Ele indica que a decisão na seara civil, penal ou administrativa não influi na análise dos mesmos fatos pelas demais esferas. A exceção é quando há absolvição por inexistência de fato ou de negativa de autoria.

Dolo pra um e pra outro

Relator, o ministro Alexandre de Moraes votou por manter a condenação criminal. A razão é predominantemente processual: para afastar a condenação de João Dan, o TSE precisaria analisar fatos e provas, medida vedada em seus julgamentos por conta da Súmula 24.

Abriu a divergência o ministro Raul Araújo, para quem há uma incongruência grave na conduta do TRE-MS. Isso porque ambos os casos se baseiam nos mesmos fatos e passam por uma definição: que o ato praticado tenha a específica finalidade de obter votos.

A jurisprudência do TSE indica que o ilícito cível-eleitoral de captação ilícita de sufrágio depende de três critérios: a conduta de oferecer ou prometer vantagem pessoal, a finalidade de obter votos em troca disso e o ato ter sido praticado no período eleitoral.

Já a condenação criminal tem duas elementares: o dolo específico de obter o voto do eleitor e prova robusta da pratica criminosa. Isso faz com que exista uma relação de prejudicialidade entre ambas as instâncias criminais, já que a independência entre elas não é absoluta.

"Como pode o tribunal regional, com esteio nos mesmos fatos e provas, entender no feito cível que não houve intenção de comprar votos e, no feito criminal, perfilar conclusão oposta, assentando que houve dolo especifico em corromper voto do eleitor?", indagou o ministro Raul.

Coerência em questão

O voto divergente ainda aponta que a absolvição na Aije foi confirmada pelo próprio TSE. Logo, cabe à Corte, por coerência, ter a mesma conclusão sobre a inexistência do dolo de comprar votos, o que levará à absolvição do acusado na ação criminal.

O ministro Alexandre de Moraes, por sua vez, não vê incoerência em manter a condenação. Ele defendeu que, em ambos os casos, o TSE se atenha à análise de fatos e provas feita pelo TRE-MS. "Se não analisamos as provas na outra ação, por que poderíamos analisar nessa?", indagou.

*Colaborou José Almir Portela

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.